quarta-feira, agosto 31, 2005

Pêcapêmipênhapêda

placenta

puro proteção

pipa pirulito patins

paixão parótidas pretensão pormenores

portinari picasso paulo prado pleonasmo

pato pateta paca pingüela pinto perereca

parada porta perda puritano polido porventura pedra
pó.

Pó pororó pó pó.

terça-feira, agosto 30, 2005

Intervalo

Um dia para respirar.
Um dia para expirar.
Um dia para inspirar.

Preparando-me pro segundo ato.

segunda-feira, agosto 29, 2005

Desenho

Não há algo que me dê mais medo do que desenhar. Quando vem aquela vontade de começar uns rabiscos despretensiosos eu percebo a agonia que é começar algo do nada. Não se sabe o que vai acontecer, se a sombra ficará boa. Se terá originalidade com um toque do surrealismo de Dalí. Se mostrará o que sinto, e não tão somente o que vejo. Se minha mão irá tremer. Talvez a incerteza me dê mais medo do que desenhar.
Começo um traço vertical. Apago. Começo outro horizontal. Quem dizia mesmo que deveríamos ser mais horizontais? Certo, sem mais malícia. Não, com mais malícia! Com pimenta calabresa... Pizza, sim, ou comida tailandesa. Apago o traço horizontal e inicio uma curva (pois se a vida não é algo circular?). Manejos para cá e para lá, esfumaço, uma sombra aqui e outra ali. Olhos inquisidores, boca trêmula imóvel.
Sai algo que não sei bem o que é. Mas sai e já está fora de meu controle. E continua saindo, não posso ou devo me controlar. Para desenhar é preciso coragem.

Para viver também.

domingo, agosto 28, 2005

Cicatrizes

Cada cicatriz minha me lembra algo. Teria vergonha se não soubesse sobre tudo que compõe meu corpo, desde os genes dos meus ancestrais (marcas alheias em mim) até as minhas cicatrizes (as marcas dos meus caminhos).
Se nos filmes, ao passarmos por caminhos tortuosos e sombrios, carregamos arranhões, os arranhões da vida vêm das mais belas e ingênuas brincadeiras de criança. Não digo que não houve sofrimento: o êxtase sempre acabava em choro. Mas digo que toda a felicidade do pega-pega e do esconde-esconde prevalecia. Todas as minhas lembranças doces da minha infância se eternizaram em marcas de amargas feridas, mas se esternizaram.
Sobre essa infância, devo dizer que perdura até hoje. Que perdurará para sempre se eu for perita na arte de viver. Que o esconde-esconde nunca será revelado, e os arranhões sempre acontecerão no dia-a-dia ou na vida-a-vida.
Outras marcas (invisíveis aos outros, gritantes a mim) compõem meu eu. Não acredito em coisas metafísicas, mas eu diria então sobre o quê? As marcas do meu cérebro? Tirarei uma licença literária para falar das marcas da minha alma. Aquelas que fizeram de mim o que eu sou hoje, e das quais não consigo ( e nem posso) me desvencilhar. Elas talvez sejam marcas de filmes, de caminhs tortuosos... Não sei. Essas são as lembranças que ficam. São as lembranças que me fazem seguir em frente, até que a minha vontade de viver esteja saciada.
Ademais, devo dizer que ainda tenho muita pele lisa e alma intocada. Continuo assim, moldando-me, até que eu mesma seja uma marca para mim, ou para alguém... Ou para ninguém.

sábado, agosto 27, 2005

Solilóquios

Sobre as coisas que eu pensava:

Pensei que nunca aprenderia andar de bicicleta (aprendi e nunca mais esqueci, apesar da falta de prática), pensei que os laços eram como nós em cordas de marinheiro (mas eles romperam-se um a um... até os que atavam-me os pulsos), pensei que a vida fosse como um filme (mas senti falta de uma trilha sonora e um final feliz, mas em algo não me enganei: a maquiagem sempre esteve ou estará lá), pensei que o ódio fosse pra sempre (e é eterno enquanto dura, o que seria só o tempo que demora pra um suquinho de maracujá fazer efeito) e que a vingança fosse a solução (mas se perde com o maracujá também), que a justiça não falhasse (sem comentários), que a ética fosse um objetivo comum, que as utopias tinham a mesma distância da nossa vontade, que ser amada era melhor que amar (mas o amor só é sentido quando parte de você, mesmo que não alcance ninguém), que a beleza se resumia às Barbies e garotas que não fossem eu, que amava o suficiente (e já estou eu amando mais do que julgava ser capaz), que não fosse suportar (a dor, a felicidade, o medo...), que a felicidade não poderia ser maior ( e foi!) ou que nunca acabaria (nada é perfeito...), que a tomada não dava choque (AI!), que estava tendo as chagas de cristo (cortes ivoluntários em "inofensivas" folhas de papel), que acreditava em deus (sim, agora só escrevo com letra minúscula), que iria morrer por ter inalado uma substância um tanto quanto ácida e/ou tóxica (três copos de leite...), que iria embora (e fiquei), que fosse ficar (e lá vou eu), que tinha vivido tudo (então soprei as 16 velinhas), que não tinha vivido nada (e escrevi esse texto).

P.S.: Pensei também que já tinha experimentado de tudo (mas bebi sucos de uvaia e physalis).

P.S.:

(Dedico esse fragmento à Bia-chan)

Pensei que fosse obrigatório gastar pelo menos um horário de aula na Match Point (mas descobri que existiam aulas Português - que Carlos? Ahn, professor?) e que aquela história de "quem brinca com fogo é pra se queimar" fosse conversa fiada (e descobri que plástico derretido arde pra caramba e que cicatrizes são eternas - e que não devemos queimar mesas de plástico alheias).

Não é muito meu estilo, mas precisava constar.

sexta-feira, agosto 26, 2005

Eidetismo II

De repente deparo-me com um bosque em minha frente. Fora as gramíneas, os primeiros vegetais que meu olhar intercepta são jovens, são mudas. Evoluem para árvores imponentes e majestosas... Que são flores perto destas, tão garbosas? Festa das cores, perfume da primavera, dança selvagem e sutil: convite a um passeio. Conforme vou, excitada, adentrando-me à floresta, as cores vão desaparecendo, assim como a vida. Árvores tão vistosas envelhecem, o tempo passa e não o vejo, não o alcanço. A medida que avanço o ar torna-se denso e viciado, as cores se perdem totalmente, a luz também. Perco a direção, para onde devo ir?, perdida começo a girar sem mover os pés. Corro desesperadamente, o gosto de sangue na boca, o calor, as feridas e os arranhões, degrado(-me). Com o tempo e o cansaço, tudo fica mais nítido e claro. Alcanço uma clareira onde, atônita, vejo bruxas enforcadas nas árvores com os pés de morte balançando em um passivo e mórbido bailar. E o olhar de quem viu verdade. O olhar me incomoda e faz surgir ruídos dolorosos na minha cabeça. Começo a gritar de desespero, perco o chão sob os meus pés e inicio uma queda infindável em meio às trevas.
Depois da tormenta, a calmaria: passeio por um jardim repleto de flores, onde, ao longe, crianças brincam em um playground. Está chovendo e trovejando, pelas narinas o cheiro de terra molhada. Está escuro, mas perfeito: a chuva é minha redenção, os trovões embalam os sentidos cada vez mais aguçados.
O despertador toca, rapidamente me arrumo pra mais um dia de olhares massacrantes no colégio. Corro para não perder a aula, como se ansiasse pelos olhares de reprovação. Ao encarar a professora, sinto um frio estranho: meus pés estão descalços e o chão, gélido. Gélido como as risadas da sala. Gélido como a idéia de não ter sapatos. Gélido como a vida de uma criança perdida.

quinta-feira, agosto 25, 2005

Seis

O que eu disse: Beije-me como você nunca me beijou antes.
O que eu queria dizer: Beije-me como você nunca me beijou antes, como nunca pretende beijar outra garota, como nunca beijou alguém no seu passado. Beije-me como se fosse o fim do mundo e o céu e a terra se unissem para este momento especial. Beije-me com a suavidade da seda. Beije-me com força e eloqüência. Beije-me com ânsia e desejo. Beije-me respeitosamente (e finja que sou uma dama) e ardentemente como beijaria uma fulana atraente. Beije-me como se me odiasse. Beije-me como se me amasse. Beije-me como se, simplesmente, se importasse. Beije-me como se fosse a única coisa que lhe restasse...
O que eu fiz: Esperei.
O que ele ouviu: Mais uma sandice.
O que ele queria ouvir : Talvez nada.
O que ele fez: Riu.

E me beijou de um jeito que nunca esquecerei.

quarta-feira, agosto 24, 2005

Ra ta ta

Algo como a loucura
que me atravessa;
oh! doce contato, eu e
você.

Nesse compasso quebra-se
qualquer lei física;
no mesmo espaço, eu e
você.

Mas na palavra (,)
d i s t a n c i a m e n t o

Quero voltar pro sul
(por) inteiro.

terça-feira, agosto 23, 2005

Sobre os amores

Não sei o que pensar sobre o amor. Não sei o que pensar sobre os amores que tive. Não sei o que pensar sobre o amor que tenho. Ou os que terei. Dizem que amor não é pra pensar, é pra sentir, mas eu não consigo evitar de fazer o que me é impróprio.
Não posso mais sentir o passado, racionalizarei-o então: o que eles significaram para mim? No momento meu olhar era terno (penso, às vezes, que terno como o de uma mãe - mas não foram eles meus filhos... Só se filhos forem ilusões). Eram tantas as idealizações e, paralelamente, tantas as decepções, e no saldo final é como se positivo com negativo desse zero. E eles fossem insignificantes. Ou nem existissem.
O presente é vívido, posso tocá-lo e senti-lo tão profundamente que dói. Tão profundamente que estremeço, e às vezes até esqueço. Sobre ele tenho um olhar apaixonado, pois nele sou amante e, quem sabe, amada. É como uma inundação na psiquê, fresca e agoniante, por ora sufocante, mas que não deixa de ser um banho frio em uma noite enluarada e quente de verão. Não consigo, agora, perceber o trilha paralela das idealizações, e tenho medo de percebê-la futuramente (como conseguiria lidar com a possibilidade de o saldo final ser novamente zero? Que o que é, nesse momento, tudo, um dia seja nada?).
No futuro a trilha das idealizações anula a realidade. E tudo é perfeito, como eu sempre sonhei, com príncipes encantados me acariciando com tanto respeito e amor que eu transbordo. De alegria. De emoção. De enjôo. Mas transbordo e alcanço a tão sonhada utopia. Me sinto bem às vezes por não conseguir nunca alcançar o futuro (porque, depois dos despojos do enjôo, o saldo também haveria de ser negativo).

Lições do dia: carinho com o passado, apreço pelo presente, realismo no futuro.

Só falta decorar.

segunda-feira, agosto 22, 2005

Bloqueio

Eu não consigo mais escrever. As músicas, ó céus!, não saem da minha cabeça. Entram pelos meus ouvidos e ecoam, ecoam, melodiosas, na minha mente - dizendo por mim tudo o que eu queria dizer, mas não sabia. Minhas angústias, paixões, desilusões, esperanças, todas, dançando serenas em bocas alheias.
Me sinto impotente ao pensar que existe algo que impeça a mais íntima de todas as minhas relações: minha lapiseira preta. De que valem as palavras que aprendi, as que irei aprender, as que nunca aprenderei, o estilo, as alusões, o texto, o intertexto, o contexto, e todo o resto do universo da escrita no qual entrei de penetra (e sem querer) se tudo o que eu tenho a dizer foi dito por vozes suaves e dedilhar de violões?
Sim, elas falam de tudo: de como dói a ausência e a rejeição, de quão eterno é o amor, de como o mundo me mantém embasbacada e admirada, de como desejo que minha vida seja um filme (se já não o é), da saudade, do medo, da vontade de morrer e da ânsia de viver.. De tudo (tudo!) que é minha vida.
E agora, silenciosamente, com braços baixos, adormecidos, e o olhar perplexo, percebo que todos os meus mistérios que tento (com muito custo) desvendar e passar para o papel já foram cantados por estranhos.

Somos todos tão iguais assim?

domingo, agosto 21, 2005

Desarticulada

Ao chegar em casa, a mesma cama, os mesmos livros, a mesma desordem. Mas algo diferente sobrevoa minha mente. Falta algo, um braço, um pé ou um fio de cabelo? Você.

Como sinto falta daqueles tempos, de quando meu mundinho caótico me bastava, de quando essa sua presença fugaz não entrava e saía silenciosamente de mim (e comigo ficar o vazio mais cheio que se possa existir). Você, constantemente tirando algo de mim, me deixando nua por dentro e por fora e estranhamente, deixando em mim algo que não consigo entender e ainda não sei se é bom ou ruim. Você, deixando sua marca, como diria, "crescendo dentro de mim".

E gosto disso? Não sei. É como se só percebesse quando estivesse nessa sua presença viva que me faz vibrar e me faz ver as coisas claramente, sem perceber. Sem entender. Mas quando estou longe de você sinto a marca que ficou, no seu cheiro a impregnar meu corpo e sua imagem a inundar meus olhos, mas ainda sem entender. É tão óbvio, mas incompreensível. Estaria eu agora definindo a saudade?

Quero sua presença para entender o que se passa, para essa marca se concretizar, para o escuro parecer mais claro, e, no entanto, continuar escuro. Para entender. Para esquecer. Você.

sexta-feira, agosto 19, 2005

Medo

Eu tenho medo de quando toca, toca, e ninguém atende. Quando o seu celular está desligado. Quando não consigo falar com você. Quando não consigo o rastrear. Quando eu mesma falo em "rastrear". Quando você simplesmente some, nem que seja por alguns momentos. Quando eu tento agir como se você nunca tivesse existido. Quando tento agir como se você nunca estivesse existido pra mim. Quando tento agir como se eu nunca tivesse existido pra você. Quando eu não consigo falar com você para ter a certeza de que pelo menos alguém existe para alguém: você para mim.
Eu tenho medo quando penso no que pode acontecer. Quando penso que você pode estar se jogando em algo ou de algo de olhos fechados. Quando penso que você pode se cortar sem querer. Ou por querer. Quando penso que você pode estar comendo ou ingerindo coisas estragadas (por que nunca olha o prazo de validade). Quando penso que não estou por perto para garantir a sua segurança. Quando penso que você está feliz com isso.
Eu tenho medo de saber que você se esqueceu de pensar em mim. Que isso signifique liberdade para você. Que você goste dessa liberdade.
Eu tenho medo de que você se esqueça que eu tenho medo. E tenho medo que isso seja para sempre.

quinta-feira, agosto 18, 2005

Sentido

Hoje foi o dia dos sentidos. Os arranhões transformaram-se em cortes e carinhos tornaram-se profundos e muito mais verdadeiros.
Mas o prazer foi o senhor do dia. Imagens oníricas, vozes melodiosas, corpos úmidos e quentes e gosto de maracujá faziam dos cortes meros coadjuvantes.

Quanto mais aguçados se tornam os sentidos, mais distante se torna o sentido.

Sentido de quê?

Viver?

quarta-feira, agosto 17, 2005

Eidetismo

Mãos nuca lábios língua saliva e, de repente, um par de olhos estranhos me encaram eternecidos. Como explicar o infinito dentro do beijo de um estranho? O infinito remexe minhas entranhas e meus músculos se contraem sem que, no entanto, eu sinta frio. Não sei dizer como era quem me beijou, se era feio ou bonito, sua impressão em mim não era dada pela sua aparência. Sua aparência simplesmente não importava em um mundo distante onde imagens são irrelevantes. Me apaixono pela idéia da existência desse estranho sem rosto, mas com olhar tão eternecido...

Olho em volta e me encontro em um bambuzal onde todos os tons são marrons. Uma cobra rasteja à minha volta amistosamente, como quem desse apenas um conselho amigo, como quem profetizasse algo. Tudo escurece de repente e fecho os olhos. O asco toma conta de mim, abro os olhos para saber de onde vem tal sentimento. Me vejo então afundada em meio a aranhas, anelídeos, cobras e baratas, que se refestelam em mim. Incontrolavelmente sai de mim um grito visceral.

Quando percebo, estou em uma piscina, em uma imersão em algo que talvez fosse eu mesma. Consigo respirar sob a água, mas minha respiração se torna difícil e estou prestes a sufocar quando tento subir à superfície. Descubro que a piscina está coberta de vidro, e ouço o som cortante de saltos e sapatos masculinos dançando valsa sobre ele. Bato no vidro e meus punhos começam a doer, mas nenhum convidado da festa mórbida parece me escutar... Minha vista se escurece.

terça-feira, agosto 16, 2005

Ponto

De manhã, quando acordo, estou num filme em câmera lenta (ora em preto-e-branco, ora em tecnicolor - não que isso seja importante). A maquiagem é ótima: cara amassada e olheira, um pouco exagerada. A edição de imagens também, desordenadamente perfeita! E eu, modéstia à parte, pareço ter sido feita para interpretar eu mesma, com um andar vacilante e lacônicos "nhá".
O diretor não tinha sincronizado muito bem o filme com a realidade e, se meu filme era em câmera lenta, a areia ainda caía voraz na ampulheta. Ao perceber isso, precipito-me escada acima (projeto singular, o do meu prédio) e vejo o ônibus passar cambaleante. Comecei a correr como algo que não lembrava nada a personagem de alguns minutos atrás.
(Lembro da minha vida sedentária quando após três minutos de corrida eu esmoreço - e o ônibus se vai, esquecendo-se de parar no ponto).
O motorista havia me visto, trocamos olhares (suplicantes, os meus), por que não parou? Então eu sinto como a atividade anômala abalara meu organismo ineficiente: meu coração disparava, estava gélida, a garganta doía com a entrada e saída constante do ar frio, a rua formava uma anel ao meu redor.
Sento e choro como uma criança perdida. Por que não parou? Seria verdade então que ninguém neste mundo pensava nos outros, ou em mim (de vez em quando)? Não quero parecer egocêntrica, mas às vezes eu não sou capaz de pensar sozinha em mim mesma, então sento e choro. Como uma criança perdida.
Pessoas passam e parecem não se importar com a tragicomédia que é a minha vida (onde estava a esplendorosa atriz do início da manhã?).
Levanto-me e vou caminhando para a escola.

"Keep walking. Johnnie Walker."

sábado, agosto 13, 2005

Mulheres

Impressões comedidas:
algodão-doce e brigadeiro
tempestades em copos d'água
amores mal-resolvidos
toilete feminino
poesia e Adriana Calcanhoto
conversa de cabelereiro
sexo com amor
(às vezes sem também)
latidos à noite
(acompanhamento: solidão)
insegurança e rubor da face
utopias esclarecidas
(ou não)
adversidades com retorno
volante
lutadora de espadas em potencial
mistério sem mistério
mal-compreendida
ginecologista
perversa e doce
amada por alguém
(mesmo se o alguém for ninguém)
adedanha...
e final - válido para qualquer outro ser.

Esclarecimento

(Não gosto muito de intervir, mas acho que nesse caso pode ser necessário)
Aos que pensaram que eu fosse, ou quisesse, me suicidar (alguns que comentaram e outros que falaram comigo pessoalmente), o que eu tenho a dizer é que isso não tem passado pela minha cabeça - na verdade, não costumo querer isso - e peço para que leiam mais atentamente a citação de Pablo Neruda no início do post.
(Às vezes falho ao nunca deixar as coisas bem claras, como a felicidade que anda rondando a minha vida).
De qualquer forma, agradeço a preocupação.

sexta-feira, agosto 12, 2005

Fantasmas

"As memórias do memorialista não são as memórias do poeta. Aquele viveu talvez menos, porém fotografou muito mais e nos diverte com a perfeição dos detalhes; este nos entrega uma galeria de fantasmas sacudidos pelo fogo e a sombra de sua época." Pablo Neruda


Fantasmas
(em memória daqueles que não suportaram mais)

Quando o corpo desaba:
cai de joelhos.
trezentos e sessenta graus
de ângulos incertos,
sussuros ao longe
(que estão tão perto!)
prevêm tardiamente a tormenta.
desesperos vãos, caminho
inexistente, perda total...

(Quando cortar os pulsos é a menor das dores.)

quinta-feira, agosto 11, 2005

Dados

Olha-se no espelho e tenta tocar a imagem, a garota atrás do espelho, e questiona se seria si mesma quem a olhava perplexa do outro lado. Como se, de repente, surgisse um abismo que liga as idéias às imagens, sendo o mundo à sua volta de uma aleatoriedade assustadora.

Às vezes é difícil acreditar que a sua vida aconteça na sua própria vida.

(Talvez a felicidade esteja na crença do que é inacreditável)

quarta-feira, agosto 10, 2005

Cena de Cinema

Acorda com a cara de quem tivesse dormido por uma eternidade, embora a eternidade representasse em seu rosto sereno de olhos profundos e boca vermelha um segundo de inconsciência. Cara idealizada de belos sonhos (embora qualquer pessoa normal, tendo sonhos ou pesadelos, acorde com a cara amassada - ressalte-se então que ela não seja uma pessoa normal e que contenha em si toda a paixão do mundo considerando que a paixão, embora aromatizada artificialmente, seja real e que se ela contém toda a paixão do mundo também contém toda a beleza e que, se os passarinhos cantam e as borboletas voam, são para ela e que o mundo todo gira ao seu redor em um bairro pacato de Nova Iorque).
Troca de roupa (vestido florido com decote que mostra que, se sua alma é de menina, sua beleza é de mulher: desliza pelo seu corpo como o ritual de uma rainha egípcia), e sai para a rua para se certificar que o mundo existe, embora aquela perfeição de efeito especial de última geração não a incomode ou a faça desconfiar.
Fala com o padeiro, velho amigo de seus pais, e prova dos biscoitos mais delicados, para enfim escolher uma baguete com gergelim (seria Paris?), quando algo a faz deixar o pão cair como se crianças na Etiópia não passasem fome - por um momento esqueci-me de que seu mundo é perfeito.
Mas como? Não havia ele partido para uma missão com outros doutores a fim de combater a desnutrição das crianças na Etiópia (?) ? No entanto estava ele no outro lado da rua, voltara mais cedo seu amor, o único amor, o amor infinito, ao perceber que queria mesmo era uma vida perfeita ao lado da menina/mulher/deusa num bairro pacato de Nova Iorque/Paris. Ela imóvel, ele decidido. Com um ramalhete de rosas colombianas vermelhas na mão, e o sorriso de uma vida feliz nos olhos, atravessa correndo a rua quando um carro o atropela de modo que ele se espatifa a cinco metros do local, assim como as pétalas das rosas colombianas.

Felizmente não resisti à realidade.

terça-feira, agosto 09, 2005

Standby


Senta se afasta outros sentam levanta anda para um lado e para o outro fura o chão 'não é meu ônibus' são seis e meia '4111 de novo?' anda para um lado anda para o outro fura o chão senta e se afasta. O momento flui e se esvai.

Onde estariam os pensamentos? Feriando talvez ("esperando o trem"). Tenho pressa, quero chegar em casa, fazer o que deve ser feito, o trivial pesa nas costas já plúmbeas ("esperando o sol"). Quero me divertir até o amanhecer, dormir é o possível.

Há muito espero esse trem, e ele passa, por que não o alcanço? A pé a esta hora é um perigo. Vidas inteiras se passam e inúmeros 4111, quando chegará minha vez? Espero os dias na ânsia de terminá-los, esperando um dia que eu não queira que ele termine ("no desespero de esperar demais" quero voltar atrás - mas o trem não percorre tais vias).

Sento, afasto-me da moça sentada ao meu lado, a proximidade me incomoda. Às vezes sonho que acredito em um deus e que, se a areia cai na ampulheta, é ingênua ilusão de ótica. Surreal.Mas há somente a espera do fim do dia, a espera do dia sem fim ("esperando a festa, esperando a sorte, esperando a morte, esperando o norte"), do surreal. A espera do tempo precioso que não queria gastar, onde encontro uma pedra para atirar no quinquagésimo segundo 4111?

("Esperando enfim, nada mais além. Esperança aflita, bendita, infinita do apito do trem")

Se viver é aproximar-se cada vez mais da morte, acabo por querer suicidar-me um pouco por dia.



P.S.: http://chico-buarque.letras.terra.com.br/letras/45160/

segunda-feira, agosto 08, 2005

P.S.:

Pão-com-manteiga também serve, mas não fica bom com folha-de-louro.

Sobre o nada

O que tenho a dizer hoje é nada porque acordei me sentindo arroz-com-feijão. Ora, se não é do nada que se começa tudo? Claro que arroz com feijão nunca vira canjiquinha da Tia Mercês, mas, enfim, feijão fica diferente com uma folha-de-louro.

Hoje, por exemplo, percebi que ser a filha predileta de Rajneesh também é ser arroz-com-feijão. De que adianta ser mulher se ainda existe a felicidade (ou a tristeza) morna e indefesa do nada? Sim, indefesa, mas a covardia humana nem sempre a ataca. Filhas de Rajneesh não a atacam, quanto mais a predileta, questão de honra, enfim.

Oh, sim!

Só mulheres sabem usar folha-de-louro...