segunda-feira, junho 04, 2007

Cantiga do poeta vivo que reviveu, morto.

Algo se perdeu no texto...
assim!, entre as entrelinhas
entre todas redondilhas
e todas prosas a esmo.

Ai de mim!, perdi a rima!
Ai de ti!, perdeu desejo!
E o amor esconde no ensejo o
que o tempo esconde na brisa.

Toda a emoção e paz
a obscurecer a letra...
Só essa inspiração fugaz
A brincar comigo, leda!

Ai de mim!, perdi a rima!
Ai de ti!, perdeu desejo!
E o amor esconde no ensejo o
que o tempo esconde na brisa...


*


... E o quê o tempo esconde na brisa?...

domingo, junho 03, 2007

Eidetismo III

Esse branco me irrita. Tenho uma folha em branco na minha frente, mas ela me irrita. Quero rasgá-la com os dentes, mas a folha é indestrutível. Ela me provoca nessa branqueza toda. Ela me provoca desde sempre. O branco é um despudor de luz; o branco é quem quer que esteja fora disso tudo cuspindo na nossa cara. A folha em branco é uma afronta. A tábula rasa também é uma afronta.

E nós temos nossas mãos que estão atadas. Os punhos cerrados, a contração, a contrição. Nascemos para o despreparo, e por mais que tentemos deixar nossa marca, ela esvanece com o tempo. O que resta é a tábula rasa que não conseguimos marcar - não do jeito que imaginávamos. O que resta é essa experiência vil, experiência que não consegue enfrentar a folha em branco. Não cospe de volta. Não rabisca, não molha, não rasga, não pinta, não suja. Não há sombra.

Há a criança, a última criança, sentada no chão e encostada nas ruínas do muro, folheando páginas em branco de um livro que a humanidade não foi capaz de escrever - embora o branco não a incomodasse nem um pouco.