terça-feira, janeiro 15, 2008

Mapas

Pra começar, você vai precisar de um mapa.
Quando começarmos, pensaremos que é possível atravessar o Oceano Pacífico a nado. Bom, não é, mas não faz mal começar sonhando. Pensar grande é o começo de tudo, tudo que é grandioso. Depois você vai descobrir que existem outros mapas, pequenos mapas, para coisas talvez maiores que o mundo... O mapa para o coração do rapaz que você segue com os olhos há um mês, o mapa para a compreensão dos seus pais, o mapa para aquela faculdade ou aquele emprego, o mapa do metrô. Estudá-los-á tanto que talvez os decore. Talvez pense que seria mais fácil cruzar o Pacífico a nado.
Você estará sozinho. Infelizmente não é possível contar com a existência das outras pessoas tanto quanto se conta com a sua própria. É claro que terá a família, e seus amigos... Eles farão você acreditar que não está sozinho embora, acredite, você esteja. Eles o convencerão disso quando não existir mais uma viv'alma que lhe cruze a vista. Você acreditará, e acreditar é tudo. Agradeça aos seus amigos por fazê-lo acreditar de vez em quando.
É importante também sempre andar para frente. Só volte quando estritamente necessário, quando precisar de informações. O mundo é meio grande demais pra você não sair do mesmo lugar enquanto o tempo passa! Se a insegurança o fizer tropeçar, mergulhe no lago mais próximo, e siga a viagem. A insegurança é outra coisa que deve ser esquecida, embora sempre esteja lá.

Tenha paciência e perseverança. A caminhada prosseguirá melhor assim. E o mais importante: esqueça o maldito filtro solar. Leve uma toalha e um mapa, e boa viagem.

segunda-feira, janeiro 14, 2008

Round Final

Eu estava aqui a pensar nessa minha longa espera, sabe, a espera que é humilde em si mas que guarda todas as arrogâncias e pretensões, eu espero o dia em que você me cause inveja, jovem, inveja, não preciso disso para sentir-me viva, só não quero sentir-me competindo com um alguém que não parece ser digna de tal competição, alguém que debate-se com seu mísero talento para fazer algo parcamente tolerável, alguém que sempre que chamo ao ringue me mostra uma cara já deformada das batalhas, alguém em quem eu teria dó até de cuspir.

Estou lutando sozinha. Eu a invejo.

quinta-feira, janeiro 10, 2008

Sex and the City

Computador.
"Às sete, na Augusta?"
Que roupa?, vestido, o vermelho ou o preto?, o preto, sim, será que ele ainda me serve, comi tanto nessas festas e afins e ah, serviu, droga!, que preguiça de me depilar, que calor pra usar meia-calça, outra roupa, huuum, que roupa?, calça jeans... "carro-bomba deixa um morto em Bagdá; Polícia iraquiana encontra mais três corpos" ... calça jeans agora é chic, esse sapato?, salto alto demais, que-se-foda-vou-de-allstar, eis então que meu allstar branco é agora marrom..., alguma maquiagem (mas e se ele não me reconhecer depois), e eu, tenho me reconhecido?, sem-crises-existenciais-agora-você-tem-sono-demais-pra-isso, queria tanto usar o vestido, talvez minhas pernas não estejam tão ruins e AH!
Computador.
"Acho que não vou mais, Pedrinho."
"O que aconteceu?"
"Uma fatalidade."

quarta-feira, janeiro 02, 2008

O Amor dos Tempos do Cólera

Descia as escadas do cinema, com dificuldade. Os passos incertos e os braços flácidos mostravam a avançada idade. Sob o coque asseado, branco e lustroso como os lençóis de cetim da sua lua-de-mel, estava sua nuca lisa. Lisa, aveludada, com algumas sardas e incrivelmente jovem. Pergunto-me quantos amantes não quereriam, agora, contar todas as sardas da sua nuca e beijá-la com fervor adolescente e paciência experiente. Um punhado. Talvez um deles a admirasse há anos, admiração que o tempo não apagou, e sonha há anos com sua nuca. Talvez nunca tenha dito a ela pois pensa que é demência não esquecer uma nuca. Com certeza teremos algo em nós que nunca será esquecido, algo que carregue um frenesi adolescente para sempre.

E é nauseante, no frenesi adolescente de hoje, perceber que não nos falta tempo para amar.